Aprovado em 2001, o Estatuto da Cidade completa 20 anos em julho. Internacionalmente reconhecida, a Lei 10.257/2001 traz uma série de instrumentos importantes para o ordenamento e a regularização da questão urbana. Foi ela que, entre outras determinações, tornou obrigatória a aprovação de planos diretores para todos os municípios do país com mais de 20 mil habitantes. Para a efetivação desse planejamento, assim como outros acontecimentos de impacto abrangente e coletivo nas cidades, o Estatuto também estabeleceu a inclusão da sociedade nas discussões.
O progresso ao longo dos anos foi visível e significativo – principalmente em se tratando da demarcação das chamadas “zonas de interesse social”, indo de encontro ao acesso à moradia, aos planos de mobilidade, à infraestrutura urbana e equipamentos públicos. A lei, ao regulamentar os capítulos 182 e 183 da Constituição Federal, proporcionou ao país, afinal, os meios legais para efetivar o direito social à cidade.
Nesse sentido, outra proposta de extrema importância do Estatuto, nunca praticada em Goiânia, é a utilização compulsória do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado. Para isso, o município pode aplicar, por exemplo, o IPTU progressivo no tempo, que pode levar inclusive à desapropriação. Afinal, um lote vazio, em pleno Centro dotado de toda a infraestrutura, onera o bolso de todos os cidadãos.
Apesar dos avanços e do marco histórico jurídico, ainda falhamos na prática. Em grande parte, os planos diretores mostraram que a legislação chegou à porção do território consolidado e legal, mas ainda não alcançou as nossas imensas e populosas periferias. Também sobram exemplos de contradições, como os planos diretores que foram elaborados com a prática de copia e cola, sem a análise da realidade do município. E tantos outros que foram judicializados, por não terem contado com a participação popular.
Outra ameaça que temos assistido nos últimos anos acontece por meio do enfraquecimento dos conselhos, sindicatos e movimentos sociais. Essa situação diminuiu o papel da sociedade na criação, execução e monitoramento das ações dos órgãos públicos. Mesmo com proteção jurídica, não foi possível evitar as distorções, as “boiadas”, os desmantelados e as alterações propostas pelo mercado, que vêm ocorrendo nos últimos anos.
A pandemia escancarou problemas relacionados ao transporte público, ao acesso à água potável e ao esgotamento sanitário, às moradias precárias e à dificuldade no acesso aos serviços de saúde. Assim, deixou bem claro que muitas vezes a cidade “idealizada” nos planos diretores não alcança os cidadãos.
*Simone Buiate Brandão, arquiteta e urbanista, é conselheira do CAU/GO
Publicado originalmente no jornal O Popular, no dia 13/07/2021.