Arquitetos e engenheiros, uni-vos!
As edificações que se transformam em cenários de tragédias, por defeitos intoleráveis, repetem-se com uma indiferença que não permite esperança alguma do seu fim.
Não se fizeram por si mesmas: foram criadas. Por arquitetos, por engenheiros, por decoradores, por mestres improvisados, por gananciosos. E pelo poder público.
Não importa mais discutir a cota de cada um na perversão que cria ou agiganta as tragédias repetidas e repetidas e repetidas. A discussão não atenuaria o problema.
O poder público não é capaz nem de remediar os riscos de tragédia que estão por toda parte nas cidades. Não só nas casas noturnas e soturnas. Também nos prédios altos, em centros comerciais, no fogaréu dos restaurantes, em ginásios esportivos, lugares de diversão, por toda parte.
Não se pode crer que esse imenso mundo de riscos e imprevistos venha a ser fiscalizado pelo poder público. A falta de pessoal, o despreparo, a corrupção desmentem que o poder público seja poder fiscalizador.
Engenheiros e arquitetos, sim, podem sê-lo. Voluntários da guerra às tragédias evitáveis. Basta-lhes atentar para o que veem de irregular e de risco. Aos de maior senso humanitário ou comunitário, passear ou entrar em lugares apenas para ver como estão, nada lhes custaria. E depois comunicar às suas entidades de classe, aos setores municipais apropriados e a jornais o que precisa ser corrigido –esse seria um serviço impagável em benefício da sociedade. E da vida.
O ar inofensivo de prédios, de centros comerciais, de lugares de diversão, largados ao seu cansaço e a seus defeitos, esconde que inúmeros deles são potenciais casas da morte.
Engenheiros e arquitetos têm algo a ver com isso. Não seria demais que homenageassem as vítimas de Santa Maria tomando a sua tragédia como ponto de partida para uma missão de grandeza.
HISTÓRIA
Mais uma vez, a identificação do mandante é mais importante que a dos assassinos, se bem que esta possa levar àquela. Os vários tiros que executaram Cícero Guedes dos Santos, liderança do MST, dão continuidade a um entrevero que vem de antes do golpe de 1964, motivado pela decadência das fazendas e usinas de açúcar na região fluminense de Campos. Há casos já com 15 anos de espera pela divisão, autorizada, de área improdutiva.
É mais de meio século de violência na região, com a impunidade dos mandantes como regra geral. E hoje, para dar um toque especial à barbaridade histórica, as alterações da rodovia federal BR-101 pretendem sua passagem sobre a parcela de terras que se tornaram posses de pequenos produtores.
Janio de Freitas
Colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de São Paulo