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Confira trechos da live sobre pandemia e mobilidade, com Sérgio Avelleda, do WRI

O CAU/GO realizou na última semana a quarta live em sua conta no Instagram, dessa vez com o tema “Impacto da pandemia na mobilidade urbana”. O bate-papo ocorreu no dia 23, quando a conselheira Fernanda Mendonça conversou com o advogado Sérgio Avelleda, ex-secretário de Mobilidade e Transporte de São Paulo e atual diretor de Mobilidade Urbana no WRI (World Resources Institute), organização internacional com sede em Washington.

Clique e assista à live na íntegra.

Confira abaixo os principais temas abordados:

Formação e experiência profissional
“Eu não tenho uma formação acadêmica na área de mobilidade, não sou engenheiro, nem arquiteto, sou advogado. Em 2002 fui convidado para ser gerente jurídico do metrô de São Paulo, foi aí que o tema mobilidade começou a dominar minha agenda. Fui diretor administrativo do metrô de São Paulo e depois presidente da CPTM. Nesse momento aconteceu meu distanciamento do mundo jurídico e comecei a ficar concentrado em atividades de uma grande operadora de transporte público, que transporta hoje mais de três milhões de passageiros por dia, que administra 289 quilômetros de trilhos, com 80 estações. Em 2011, fui presidente do metrô de São Paulo, um dos melhores do mundo, em 2012 trabalhei no metrô do Rio de Janeiro, já na concessão privada. Em 2013/2014, me mudei para a Cidade do México, onde trabalhei em uma empresa brasileira com projetos de mobilidade urbana e em 2016 fui convidado para ser o secretário de mobilidade e transportes de São Paulo.”

Transporte coletivo
“Nós passamos agora uma situação de extrema dificuldade no sistema de transporte coletivo durante as medidas de isolamento social. Veja como é paradoxal: o transporte, como o nome diz, é coletivo. Ele tem uma tendência natural a formar aglomeração. Um ônibus é eficiente porque transporta bastante gente, um trem do metrô é eficiente porque tem a capacidade de transportar até duas mil pessoas. A primeira reação que nós poderíamos ter, instintiva, quando temos uma medida de isolamento social, seria até mesmo paralisar o transporte coletivo. Só que a manutenção dos serviços essenciais depende do transporte coletivo. Nós só temos hospitais funcionando, porque as pessoas estão chegando aos hospitais; nós só temos supermercados abastecidos porque os repositores conseguem chegar; só temos farmácia e também segurança pública, porque as pessoas estão chegando a esses locais pelo transporte público. Esse paradoxo gera uma dificuldade de gerenciamento do sistema e dificulta o desafio financeiro.
Antes do período de isolamento, já havia uma grande dificuldade de financiar o sistema. Havia um grande déficit entre o que se arrecada com a tarifa e os custos. Com isso, não havia investimento, não só em Goiânia, o que provocava baixo nível de qualidade e mais perda de usuários e receitas. Durante esta crise isso ficou exacerbado. Os custos fixos do sistema são muito elevados.

Não podemos sair da pandemia apenas com o legado de ter sapato fora de casa, álcool em gel e máscara, não podemos voltar para o velho normal. Se você pegar o gráfico da cidade de São Paulo antes e depois em termos de poluição, eu fico me perguntando como é que podemos viver num lugar tão imundo? Nós limpamos a casa, tomamos banho todo dia, não admitimos viver na sujeira, mas nós admitimos viver no meio de um ar imundo, que agora está limpo porque as pessoas estão se transportando menos.

Precisamos reconhecer que o transporte público não faz bem só para os usuários. Quando a única fonte de receita para pagar o transporte público vem do usuário, a gente está dizendo o seguinte: como ele só beneficia usuário, ele que se vire para pagar o sistema, e isso não é verdade, pois toda coletividade é beneficiada. O transporte público produz aquilo que os economistas chamam de ‘externalidades positivas’. Quando alguém o utiliza, ele está fazendo a cidade mais limpa, mais segura em termos de acidentes de trânsito, mais barata porque é menos infraestrutura que precisa ser desenvolvida. O transporte coletivo não pode competir em termos de conforto, mas pode competir em agilidade e rapidez, disponibilizando corredores, mais espaço e mais confiabilidade.”

Escalonamento durante a pandemia
“As cidades já têm um natural escalonamento, iniciando os serviços e escolas em horários distintos. Pode ser melhorado. A ideia é não ter um horário de “pico”, mas isso não o destrói completamente. Não adianta colocarmos mais ônibus, deve se pensar urbanisticamente. As pessoas estão morando cada vez mais longe de seus empregos, devido a uma série de fatores. O correto a ser adotado seria construir novos bairros pensando na moradia, nos serviços básicos, mas também na capacidade e viabilidade de gerar empregos naquela região.”

Bicicletas e mobilidade urbana
“As cidades precisam ter plano de mobilidade. Quando trabalhei na CPTM, construímos a primeira ciclovia de São Paulo e começamos a olhar a bicicleta como componente da mobilidade urbana. A primeira reação que algumas pessoas têm é que a bicicleta é para lazer, não para substituir o carro. Porém agora, durante a pandemia, a consciência está aumentando, as pessoas perceberam que pode ser um modo viável de transporte, além claro, de todos os benefícios que podem fornecer para a saúde. Mas é necessário investir e disponibilizar programas de incentivo.”

Calçadas
“Todo mundo é pedestre e todos passam pela calçada. Ela é uma via, com extrema relevância para as cidades, só que como cada um cuida de um jeito ou não cuida, a calçada vira um lixo, não é acessível, não é segura, não é iluminada e muitas vezes é estreita, não possui nem espaço. Há loteamentos, em muitos bairros que eu conheço, em diversas cidades, que não têm sequer calçada. Ou seja, nós negamos espaço para o maior modal. Calçada é via, faz parte do sistema viário e deveria fazer parte da agenda pública de manutenção, cuidado e recuperação. Tanto quanto as ruas onde passam os carros ou até mais.”

Estacionamentos
“A gestão é fundamental. O estacionamento é basicamente o uso privado de um espaço público. Quando eu paro meu carro na rua, estou ocupando um espaço que pertence a todos. Quando alguém usa o espaço público de forma privada, está proibindo que os demais usem. Como eu, que não tenho carro, não estaciono nas vias, porque no meu IPTU tenho que cuidar da manutenção de um espaço que será usado por uma pessoa que tem carro? Não é justo. Trata-se de um espaço que poderia ter outras utilidades, como ciclovias, ampliação de calçadas, faixas exclusivas de ônibus, áreas de convivência. Não podemos proibir o estacionamento, mas podemos regulamentar. Sou favorável que exista um sistema de cobrança. Temos tecnologias incríveis para gerir esse sistema, para fiscalizar, cobrar e pagar – é possível modernizar. A concessão também é uma opção.”

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